SEU DIREITO: A DIFÍCIL SOLUÇÃO PARA RECEBIMENTO DE VALORES CONTRATADOS COM O PODER PÚBLICO CALOTEIRO

Josemar Santana
O calote que tem vitimado os fornecedores de bens e serviços do Poder Público, nas quatro esferas de governo (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) tem sido amplo assunto de estudo por especialistas que se dedicam ao Direito Financeiro, especialmente, quando se referem “às cláusulas financeiras dos contratos administrativos”, como destaca o advogado Fernando Facury Scaff, tributarista e professor da USP (Universidade São Paulo), em artigo recente publicado na Revista Eletrônica CONSULTOR JURÍDICO, edição de 1º de dezembro deste ano de 2015, sob o título O QUE FAZER QUANDO O ESTADO CONTRATA E DÁ UM CALOTE?

É claro, quando o referido tributarista faz referência ao ESTADO, está fazendo referência geral ao PODER PÚBLICO, em todas as suas esferas e a sua abordagem vai “desde os mais simples contratos de fornecimento de bens e serviços até os complexos contratos de parcerias público-privadas, as conhecidas PPPs (Parcerias Público-Privadas)”, que são contratos formalizados entre a administração pública e empresas particulares para a realização de alguma grande obra, ou realização de serviços, passando pelos contratos de concessão simples, entre outros.

O Direito Financeiro não se restringe ao conhecimento da forma como são realizados os pagamentos dos bens e serviços contratados pelo PODER PÚBLICO, alcançando, também, como são efetuados os pagamentos de PRECATÓRIOS JUDICIAIS, assunto este que não será tratado aqui, por ser tão amplo, cuidando esta abordagem de analisar o que deve ser feito pelo contratado (pessoa física ou jurídica) para que seja cumprida corretamente uma obrigação firmada pelo PODER PÚBLICO, tendo sido objeto de um processo de licitação, com o serviço devidamente prestado ou o bem entregue e o poder público não paga pelo que recebeu, descumprindo, assim, a sua parte no contrato celebrado.

Numa situação dessas, o que é possível fazer juridicamente pela parte contratada? O ingresso Judicial de uma ação de cobrança tem sido a opção de pessoas físicas ou jurídicas para garantir o recebimento de créditos em mãos de administrações públicas caloteiras, mas, a morosidade da justiça e a quantidade de recursos disponíveis em favor do ente público, aliada aos prazos elastecidos que são assegurados ao PODER PÚBLICO, terminam criando uma “via crucis” das mais dolorosas possíveis, a ponto, muitas vezes, de levar o credor à falência.

O problema se torna mais grave quando o prestador de serviços ou fornecedor de bens se descuida e não recebe do PODER PÚBLICO a documentação necessária para reclamar o seu crédito, a exemplo do EMPENHO, que, segundo a Lei de Finanças Públicas (Lei 4.320/64) se constitui numa obrigação do PODER PÚBLICO em realizar o pagamento pendente (arrt. 58), tornando-se, pois, uma das clásulas “mais importantes dos contratos administrativo, pois a Constituição Federal determina que não pode ser feita despesa que exceda os créditos orçamentários (art. 167, II), motivo pelo qual o empenho garante a reserva de valor necessária para a despesa”, como lembra o tributarista Fernando Facury Scaff.

Mesmo porque, segundo o art. 60, da Lei 4.320/64, que segue disposição constitucional, impõe a obrigação de qualquer despesa do PODER PÚBLICO, a partir do contrato firmado, não pode ser feita sem PRÉVIO EMPENHO, que é formalizado por meio de documento chamado NOTA DE EMPENHO, a qual garante no orçamento do ente público a reserva do valor contratado, cuja efetivação do pagamento se dá pela LIQUIDAÇÃO, que nada mais é do que a verificação que o PODER PÚBLICO faz do bem ou serviço recebido, observando se as características contratadas foram obedecidas, a exemplo da qualidade e da quantidade dos bens ou serviços contratados e entregues pela parte contratada.

Pois bem, É A LIQUIDAÇÃO que gera o DIREITO ADQUIRIDO, garantido à parte contratada para prestar serviços ou fornecer bens ao PODER PÚBLICO, tornando-se ato importante praticado pelo PODER PÚBLICO, diante da pessoa física ou jurídica contratada, porque se confirma o cumprimento da obrigação por parte do fornecedor ou prestador de serviços.

Com a LIQUIDAÇÃO da NOTA DE EMPENHO, o que deve ser feito se o PODER PÚBLICO contratante não pagar a obrigação assumida? Como deve esse valor devido ser cobrado? Não há alternativa, a não ser a via judicial, o que pode desanimar a muitos contratados, pelas razões que já conhecemos, quando se trata de receber créditos de entes públicos caloteiros.

Nesse caso, da existência de processo licitatório (que escolheu o fornecedor ou prestador de serviços), da assinatura do contrato entre as partes, da feitura da NOTA DE EMPENHO (que garante os recursos devidos no orçamento) e da LIQUIDAÇÃO (que é a verificação da qualidade e da quantidade do bem ou serviço contratado, devidamente entregue pelo fornecedor ou prestador de serviços), não deve ser ajuizada uma AÇÃO ORDINÁRIA, que fica sujeita a longos e penosos trâmites e ao final ainda enfrenta o perverso sistema de precatórios, prolongado em muitos anos a satisfação do crédito do contratado, como adverte o tributarista Fernando Facury Scaff.

Se o rito se dá como acima referido, o mais adequado é o ajuizamento de uma AÇÃO DE EXECUÇÃO, que é bem mais rápido, inclusive, “com a possibilidade de penhora dos valores reservados” no EMPENHO, devendo o processo apresentar a NOTA DE EMPENHO e o respectivo DESPACHO que comprove a LIQUIDAÇÃO.

Há, naturalmente, quem discorde dessa possibilidade de resolução mais rápida, para o credor do PODER PÚBLICO se livrar do CALOTE, argumentando que os bens públicos são INALIENÁVEIS (art. 100, do Código Civil) e que, por essa razão, são IMPENHORÁVEIS (arts. 648 e 649, I, do Código de Processo Civil), existindo, como contra-argumentação, a possibilidade de penhora de dinheiro do PODER PÚBLICO, porque, nessa hipótese, o valor a ser penhorado já está tecnicamente assegurado pelo EMPENHO e pelo cumprimento do contrato pelo fornecedor ou prestador de serviço, quando o PODER PÚBLICO confirma o recebimento dos bens contratados ou dos serviços prestados, pelo DESPACHO comprobatório da LIQUIDAÇÃO.

No caso do credor optar pela AÇÃO ORDINÁRIA DE COBRANÇA, ao final do longo processo vai ter o seu direito reconhecido pela Justiça, servindo a sentença como TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL, PORTANTO, constituindo-se em direito adquirido, liquido e certo, o que garante o ajuizamento de nova ação, a de EXECUÇÃO POR TÍTULO JUDICIAL, diferentemente da AÇÃO DE EXECUÇÃO pela NOTA DE EMPNHO LIQUIDADADA, que se constitui em direito adquirido, mas de título de natureza extra-judicial, porque não foi gerada por meio de sentença judicial.

O argumento de que a AÇÃO DE EXECUÇÃO por TÍTULO EXTRAJUDICIAL não deve prevalecer, no entendimento do tributarista Fernando Scaff, “não pode ser aceito, por duas razões, ambas amparadas nas normas acima expostas: 1) o valor correspondente ao pagamento daquela etapa contratada estava empenhado, ou seja, rese4rvado para essa finalidade; e 2) a comprovação do cumprimento daquela etapa foi efetuado através da liquidação, o que gera direito adquirido, estabelecido por lei, ao recebimento dos valores, por meio do processo de execução”, o que torna desnecessário um processo ordinário para comprovar o que já está de antemão comprovado com a NOTA DE EMPENHO e o DESPACHO DE LIQUIDAÇÃO.

Mesmo porque, tem que ser levado em conta que NÃO É POSSÍVEL HAVER CONTRATAÇÃO PELO PODER PÚBLICO, SEM EMPENHO DA DESPESA A SER EFETUADA.

*Josemar Santana é jornalista e advogado, integrante do Escritório SANTANA ADVOCACIA, com unidades em SENHOR DO BONFIM (Ba), SALVADOR (Ba) e BRASÍLIA (DF).
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