AS PESSOAS COM CÂNCER (E OUTRAS DOENÇAS GRAVES)E A PROTEÇÃO JURÍDICA


* Josemar Santana

O desconhecimento por parte das pessoas portadoras de câncer e de outras doenças consideradas graves e, portanto, de alto custo de tratamento ainda é muito grande e atinge, especialmente, grande número de pacientes de baixa renda ou de renda nenhuma, que são as consideradas pela legislação, pessoas hipossuficientes.

Segundo revela a advogada Antonieta Barbosa, autora do livro Câncer: Direito e Cidadania, publicado recentemente pela Editora Atlas, todo ano são diagnosticados cerca de 500 mil casos de câncer no Brasil e a legislação destinada a proteger os pacientes dessa e de outras doenças graves está pulverizada em diferentes textos normativos de difícil localização, o que dificulta, mais ainda, a utilização dessa legislação em favor dessas pessoas.

Daí a razão de a advogada Antonieta Barbosa ter reunido em seu livro toda a legislação referente à proteção jurídica das pessoas portadoras de câncer e outras doenças graves, atraindo a atenção não só de pacientes, mas, também, de seus familiares, de advogados, de profissionais da área de saúde e dos demais segmentos sociais envolvidos com o tema.

Feitas essas considerações iniciais, vamos nos deter numa questão que aflige a quase totalidade das pessoas portadoras de câncer e de outras doenças graves, qual seja: Considerando que a medicação para tratamento de câncer e de outras doenças graves é muito cara, tem o paciente direito de solicitar do Estado o seu fornecimento?

A resposta está no art. 196, da Constituição Federal, que diz que “saúde é direito de todos e dever do Estado”, o que, num primeiro momento, implica dizer que os medicamentos necessários ao tratamento, especialmente os de alto custo, em geral inacessíveis à grande maioria da população, devem ser custeados pelo Estado.

Acontece que o art. 196 da Constituição Federal não se resume apenas à sua primeira parte, que diz: “saúde é direito de todos e dever do Estado”, vindo em seguida a segunda parte, complementando o texto da seguinte maneira: “garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

Com isso, fica claro que o direito à saúde é um direito social, garantido no art. 6º da Constituição Federal e decorre do direito á vida, estando, por isso mesmo, ligado de modo indispensável à dignidade da pessoa humana.

Há, é verdade, muita discussão sobre a aplicabilidade, a eficácia e a efetividade dos direitos sociais, e é no âmbito do direito à saúde que encontramos, sem dúvida, a maior gama de questionamentos, e, por consequência, a maior produção doutrinária e jurisprudencial a respeito da possibilidade de se reconhecerem direitos subjetivos (pessoais) diretamente embasados na Constituição.

Mesmo assim, com os muitos questionamentos e divergências, prevalece o entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal) e do STJ (Superior Tribunal de Justiça) de que é desnecessária a discussão a respeito de ser ou não ser a regra dos art. 6º e 196 da Constituição Federal, normas programáticas ou de eficácia imediata, porque regra de interpretação das palavras não pode sobrepor-se ao princípio maior estabelecido na CF/88 de que “a saúde é direito de todos e dever do Estado”.

Mas o problema está exatamente no caráter condicionado dado ao direito subjetivo à saúde, pelo art. 196, da CF/88, porque o Estado não deve estar sempre e de forma ilimitada à disposição dos interessados, sem que se verifique a condição individual de cada postulante ao referido direito subjetivo.

Exige-se, portanto, que a pessoa em tratamento de câncer e de outras doenças graves, seja hipossuficiente financeira e economicamente e que não disponha de familiares e de políticas públicas em condições de atender-lhe à necessidade de aquisição de medicamentos de alto custo ou de outras formas de tratamento também muito caros, porque, o art. 2º, § 2º, da Lei 8.080/90 dispõe que “o dever do Estado não exclui o das pessoas, das famílias, das empresas e da sociedade”.

Mesmo porque, se o Estado não verifica a hipossuficiência da pessoa em tratamento de câncer e de outras doenças graves, poderá atender a pessoas que poderão dispor de outras fontes de atendimento, em detrimento de pessoas que não dispõe da mínima condição de enfrentar o seu tratamento, o que seria muito injusto.

Comprovada a hipossuficiência e não encontrando o apoio do Estado, a pessoa portadora de câncer e de outras doenças graves poderá recorrer à Justiça, com base no art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal e ter assegurado o direito à saúde, pelo dever do Estado em atendê-lo.

* Josemar Santana é jornalista e advogado
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